Odebrecht Informa

Edição 140 – Núcleo de transformações

ONU e Fundação Odebrecht instalam no Baixo Sul da Bahia o primeiro centro de estudos e treinamentos em zona rural do Nordeste brasileiro com foco em gestão do desenvolvimento.

1 de março de 2009

Vista parcial da sede do Núcleo: localização é um importante diferencial

Texto: Juliana Lopes e Vivian Barbosa

Fotos: Almir Bindilatti

A brisa fria do fim de tarde não ultrapassou barreiras para chegar até aqui. Com o pôr-do-sol, o calor vai embora e as correntes de ar vindas do Oceano Atlântico chegam livres, até esbarrarem no cume da montanha. Aos 680 metros de altitude da Serra da Papuã, no município de Ibirapitanga, nenhuma montanha se sobrepõe. Este é o ponto mais elevado do Baixo Sul da Bahia e se localiza na Área de Proteção Ambiental (APA) do Pratigi. No horizonte, o contraste de luz e sombras reforça a multiplicidade de tons verdejantes. O olhar para mais perto revela a diversidade de espécies florestais.

Esse cenário foi o escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) e a Fundação Odebrecht para a instalação do primeiro centro de estudos e treinamentos em zona rural do Nordeste brasileiro com foco em gestão do desenvolvimento. Inaugurado em 28 de outubro, fruto de um investimento de R$ 1,4 milhão, o Núcleo de Estudos e Práticas em Governança Participativa e Desenvolvimento Comunitário nasce com a missão de identificar, apoiar e disseminar experiências bem-sucedidas nessas duas temáticas, no Brasil e em outros países da América Latina. “A localização é um importante diferencial, pois ajuda a trazer as discussões para o centro da problemática social, econômica e ambiental, onde os modelos são colocados em prática”, explica Rogério Arns, integrante da Fundação Odebrecht e responsável pelo Núcleo.

Em setembro de 2007, o então Diretor da Divisão para Administração Pública e Gestão do Desenvolvimento (DPADM) da ONU, Guido Bertucci, e o Presidente Executivo da Fundação Odebrecht, Maurício Medeiros, assinaram um memorando de entendimento buscando atender a recomendação das Nações Unidas de integrar esforços em prol da redução da pobreza e da conservação do meio ambiente. “Idealizamos este centro e é com satisfação que vemos o sonho se tornar realidade. O Brasil é um país com muitas oportunidades, mas também desafios. Articular a instalação do Núcleo aqui é obter um retrato global, em um mesmo local”, afirma Bertucci.

Ao citar o Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Baixo Sul da Bahia (DIS Baixo Sul), coordenado pela Fundação Odebrecht, Jose Manuel Sucre, representante da DPADM, destaca que é a primeira vez que as Nações Unidas encontram os objetivos do milênio combinados em uma só iniciativa de uma forma harmônica. “Trabalharemos para fazer essa experiência ser conhecida internacionalmente, levando para o mundo um modelo de como desenvolver o ser humano de modo organizado e sustentável.”

Oscar Motomura, fundador e Presidente da Amana-Key, empresa especializada em programas educacionais para executivos, destaca um aspecto importante das iniciativas do DIS Baixo Sul que favorece a experiência da governança participativa: o fortalecimento do espírito da família. “Como a menor célula de uma comunidade, a família é um excelente local para a prática da governança participativa. Além disso, oferece apoio psicológico e aconselhamento aos seus membros”, ressalta Motomura, que esteve no lançamento do Núcleo.

Biodiversidade e potencial turístico

A área ocupada pelo Núcleo de Estudos e Práticas vinha sendo desmatada desde a década de 80 para a retirada de madeira, cascalho e areia. A ação foi facilitada por uma estrada de 6 km de extensão, construída em 1973, que liga a BR-101 ao topo da Serra da Papuã. O terreno, hoje propriedade da Fundação Odebrecht, tem um solo rochoso, o que dificulta o crescimento de árvores de raízes profundas e propiciou a formação de uma vegetação gramínea chamada papuã, que deu origem ao nome do local.

Nessa serra, foi instalado o Portal da APA do Pratigi, marco inicial dos 161 mil hectares que compõem a unidade de conservação ambiental. É o ponto de partida para uma viagem pela biodiversidade da Mata Atlântica brasileira em toda a sua essência e vivacidade. Pesquisadores já encontraram, em um único hectare dessa região, cerca de 250 espécies de mariposas e 70 de formigas. “A fertilidade da APA do Pratigi nos leva a reconhecê-la como uma incubadora de soluções para o novo milênio”, diz Rogério Arns.

O aproveitamento do potencial turístico da APA do Pratigi é um dos objetivos de longo prazo para consolidar o desenvolvimento integrado e sustentável da região. A APA é um dos últimos remanescentes de Mata Atlântica do país, inclui cinco municípios e cerca de 83 mil habitantes. Entre 1970 e 2008, a região perdeu 30 mil hectares de vegetação devido ao desmatamento ocasionado, sobretudo, pela cultura de corte e fogo, praticada pelos pequenos agricultores.

A busca de oportunidades de geração de renda a partir da exploração sustentável dos recursos naturais também é tarefa da comunidade, representada em organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips) como a Agir – Associação Guardiã da APA do Pratigi. “É preciso promover mudanças na relação do proprietário com o ecossistema, mostrando que há opções de geração de renda a partir da exploração da floresta em pé. Esse é o primeiro passo para transformar a APA em um destino de turismo agroecológico”, ressalta Luís Simas, Responsável por Meio Ambiente na Agir.

Registrar para aprender

Rogério Arns reitera que há muitas experiências sobre governança participativa e desenvolvimento comunitário, mas elas estão dispersas. Por isso, o objetivo inicial do Núcleo é reunir metodologias, instrumentos, informações e especialistas nessa área.

“Apesar de termos casos riquíssimos no Brasil, vivemos mais as experiências do que as registramos. Isso dificulta o entendimento, aprimoramento e reaplicabilidade dos projetos. Por isso, nessa primeira etapa, queremos reconhecer as iniciativas já existentes e disponibilizá-las para o maior número de pessoas possível”, explica. “Ao observar as experiências de desenvolvimento comunitário e governança participativa, notamos a importância de pessoas que ajudam a comunidade a encontrar sua vocação. Por meio do Núcleo também pretendemos formar facilitadores desses processos.”

Segundo Arns, na agenda de desenvolvimento comunitário a resiliência é um dos aspectos mais importantes. “As pessoas, comunidades e organizações precisam estar preparadas para controlar todos os fatores que influenciam sua capacidade de se desenvolver e se renovar ao longo dos tempos para atingir a sustentabilidade”, ressalta.

Arns salienta ainda a necessidade e o desafio de haver projetos sociais abrangentes, compatíveis com a dimensão continental do Brasil. “Por que em Bangladesh ou na Índia há trabalhos comunitários em escala gigantesca e, na América Latina, contam-se nos dedos as iniciativas de grande impacto? O que barra a expansão dos projetos? É uma das descobertas que pretendemos fazer”, afirma. Outra frente de atuação é a organização de eventos internacionais para trazer ao Brasil seminários que são realizados no exterior. O primeiro deles já ocorreu em dezembro de 2008, com a presença dos especialistas canadenses Joanne Linzey e Dal Brodhead.

Complexo hoteleiro

Imersão. Esta palavra resume a experiência que uma estada no Núcleo de Estudos e Práticas em Governança Participativa e Desenvolvimento Comunitário proporciona a seus visitantes. O local foi estruturado para receber especialistas e pesquisadores de todo o mundo interessados em ter um ambiente seguro e confortável para realizar seus trabalhos científicos.

A parte física do Núcleo é formada por um complexo hoteleiro, composto de três bangalôs com 18 suítes e capacidade para até 34 hóspedes, e um restaurante preparado para atender até 90 pessoas, em três turnos. Ao todo, 16 funcionários, moradores da região, cuidam da operacionalização do espaço. Eles foram selecionados a partir de um programa de treinamento gratuito, feito em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). Mayara de Jesus, 21 anos, foi uma das 125 pessoas que participaram de cursos nas áreas de Turismo e Hospitalidade, Conservação e Zeladoria, e Segurança Alimentar. “Escolhi a formação de recepcionista e participei de aulas durante um mês. Estava desempregada e abracei com muito empenho essa oportunidade.”

Mayara mora com a família na comunidade de Itamarati, distrito de Ibirapitanga. Seu destaque durante a capacitação garantiu uma vaga no complexo hoteleiro. Hoje, todos os que chegam ao Núcleo de Estudos e Práticas são recebidos por ela. “Os visitantes vêm de muito longe e me esforço para que levem boas lembranças da nossa região, inclusive o meu sorriso.”

Moisés dos Santos, 19 anos, também foi beneficiado pelo curso. O sonho de ingressar na faculdade, até então impossível pela falta de recursos, agora parece mais próximo. O estudante do último ano do Ensino Médio trabalhava como garçom em um estabelecimento na beira da estrada antes de passar pela formação do Senac. “No dia em que surgia algum cliente, ganhava R$ 10,00. Se não aparecia ninguém, não recebia.”

Órfão de pai, Moisés divide a casa com o irmão e a mãe aposentada. O dinheiro para pagar o transporte e fazer a inscrição no curso foi cedido por seu antigo patrão. “’Tem de dar certo’, eu falava pra mim mesmo”, lembra com os olhos marejados de lágrimas. A realização do Programa de Desenvolvimento de Empresários (PDE) da Construtora Norberto Odebrecht, na Serra da Papuã, foi o grande teste de Moisés. “Pessoas de várias partes do mundo, diferentes culturas e idiomas estavam aqui. Busquei agir com atenção e simplicidade e consegui a vaga.” Perguntado sobre os próximos passos, o jovem não hesita em colocar seus estudos e a família como prioridades. “Vou buscar ser alguém para cuidar da minha mãe. Ela lutou por mim. Preciso fazer o mesmo por ela.”

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